Chapeleiras de Antônio Dias conservam tradição de mais de 200 anos

24/10/2011 15:55

LEONARDO MORAIS

Maria Lino

Maria Lino vende os chapéus que produz há mais quatro décadas a turistas que visitam a região

 

ANTÔNIO DIAS - A aposentada Rosa Lino Roque, de 75 anos, nem imaginava que a brincadeira dos tempos de criança, quando imitava sua mãe ao trançar folhas secas do coqueiro indaiá para fazer chapéus de palha, mais tarde seria sua principal fonte de renda. A arte garantiu o sustento dos seis filhos, ainda pequenos, quando ficou viúva. O então passatempo se tornou profissão. Os chapéus de palha produzidos no quintal da casa humilde, em Porteira Grande, na zona rural de Antônio Dias, na Região do Vale do Rio Doce, passaram a ser vendidos em larga escala para comerciantes da região. As filhas pequenas ajudavam a trançar as palhas e a buscar na mata as folhas para serem dessecadas.
 

 

O adereço também era moeda de troca no pequeno distrito. Um chapéu poderia valer até 5 quilos de arroz ou feijão. "Fiquei viúva muito nova e não tínhamos outra renda. Sabia fazer chapéus para vender para comerciantes e motoristas que cruzavam a região", comenta a mulher, que ainda hoje confecciona os adereços, porém em um ritmo mais lento. "Hoje, faço para divertimento. É uma ótima terapia".
 

 

Rosa Lina é uma das 500 mulheres que na região recebem o nome de "chapeleiras de Antônio Dias" e que mantêm a tradição de fabricar os chapéus de forma artesanal há mais de 200 anos. O negócio não chega a ser a principal fonte de renda das famílias. Mas quem trabalha no ofício garante que, mesmo com a concorrência das produções industriais, ainda é possível faturar com o acessório. "Por mês tiro em torno de R$ 400.Esse dinheiro daria para pagar minhas despesas, mas, felizmente, conto ainda com o aluguel de uma casa que comprei, o que dá uma sobra", conta a chapeleira Tereza de Sá, de 52 anos, que aprendeu aos 7 a fazer chapéus, observando o trabalho preciso da mãe, que hoje, aos 74 anos, continua trançando as palhas do coqueiro. "Não sei explicar, mas parece que nascemos com esse dom de produzir arte com a palha".
 

 

Por dia, Tereza consegue confeccionar, sozinha, nos fundos de casa, um chapéu. Para garantir firmeza nos fios entrelaçados, as tranças são passadas várias vezes em um equipamento feito também de forma artesanal chamado "descascador". O preço final do artesanato varia entre R$ 8 e R$ 10. Os compradores são de Caratinga e Governador Valadares, principalmente. "Com os chapéus consegui pagar os estudos das minhas filhas. Agora faço para divertir e passar o tempo", diz Tereza.
 

 

A produção dos chapéus segue o mesmo ritmo há pelo menos dois séculos, quando os primeiros moradores habitaram a região. A matéria-prima é retirada da palmeira indaiá, ainda jovem, uma espécie típica de regiões altas. As folhas são fervidas em fogão a lenha por cerca de duas horas e, em seguida, são expostas para secagem. O processo dura de dois a quatro dias. Antes de as folhas serem desfiadas, o material é curtido em uma caixa com enxofre. "A fase do enxoframento é para que a palha ganhe uma cor mais esbranquiçada", explica a chapeleira Maria Lino Roque de Barros, de 55 anos.
 

 

Há mais de quatro décadas, os chapéus feitos por ela são vendidos a turistas que visitam a região. As folhas que usa para fazer o artesanato são rigorosamente escolhidas pela artesã que, pelo menos duas vezes ao ano, se embrenha por entre as matas fechadas da região em busca dos coqueiros. "O segredo é encontrar a planta ainda jovem, que consegue produzir fios mais firmes", explica.